segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Precisamos escutar a rebeldia, Rio de Janeiro!


Acompanhamos, todos, cheios de esperança a ofensiva policial realizada em favelas cariocas. A esperança de um mundo melhor, sem crime, está em cada comentário. Acreditamos que a ordem venceu a perversão. A imagem de marginais em fuga captada por um emissora de TV tomou o mundo. A policia, até ontem desacreditada, vista como fonte de corrupção, tornou-se referência nacional. Os editoriais passaram a busca imediata de um héroi. Não encontraram. Então, encontraram um vilão. A Rede Globo de Televisão, especialmente, aproveitou-se para vingar Tim Lopes e dar um close em seu algoz por vários minutos. A luta do bem contra o mal estava resolvida. O bem triunfou!!!!. Trinfou????
O que significa realmente essas ocupações em territórios dominados pelo tráfico? O tráfico perdeu? O crime está abolido? O Rio de Janeiro está livre das drogas?
Apesar das notícias favoráveis, o fim dessa guerra está longe do fim. Se é que terá um fim.
A ação polilcial se fazia e se faz necessário. Acredito, inclusive, que estar algumas décadas atrasadas. A repreensão estatal vem para mostrar realmente quem manda e quem deve mandar.
Entretanto, não se combate o crime, na espécie, o tráfico, apenas com repreensão. O Estado não se resume ao aparato policial. Pelo menos não deveria resumir-se. A omissão estatal, apenas, permitiu que tal situação chegasse onde chegou. Em todas as experiências mundiais onde o Estado se faz presente o nível de vida é melhor e dentro dos padrões socialmente estipulados. Veja o exemplo da Colômbia, que levou o Estado e todas as suas facetas a locais dominados pelo crime. O Estado, e apenas ele, produz condições de igualdade em país desigual em sua essência desigual como o nosso. Há quem acredite no contrário. Entretanto, estes concretizam suas idéias em seus gabinetes refrigerados, em suas cadeiras confortáveis e que depois de um dia de cansaço sai pra jantar em um bom restaurante. Desta forma, teorizar sobre a vida dos outros é muito fácil.
Nessa história, o Estado é o grande vilão e o grande salvador. Não quero afirmar que se o Estado estivesse presente não haveria o tráfico de drogas. Longe disso. Afirmo, sim, que a omissão estatal faz surgir um ambiente favorável a todo tipo de facção criminosa. A falta de futuro faz com que as pessoas pensem apenas em sobreviver, mesmo que pra isso seja preciso matar. Como dizer a uma pessoa, excluída e completamente desassistida, desde sempre, que deve obedecer as regras estatais, criadas por uma sociedade de consumo e que tem por objetivo alijar os que estão de fora desse mercado? Soma-se a isto a falência do instituto família e o desapego as religiões, não há qualquer meio de adaptação social em vigor.
E mais, culpar apenas o criminoso apresenta-se como uma visão distorcida e distanciada dos fatos. Ora, se a uma pessoa não foi dado qualquer opção na vida, restando-a apenas o crime ou miséria honrosa, se assim podemos chamar, como culpar quem adere ao crime? Como esperar que uma pessoa que nunca recebeu um abraço, dê um abraço em alguém? Como esperar que uma pessoa criada em um ambiente de violência seja pacífico ou veja a violência com indignação como vemos? Se fossem lhe dadas oportunidades, como é dada a jovens de classe média que, ainda assim, ingressam no crime, e a escolha fosse a mesma, o crime, aí sim teriam sua culpa no caos. Enquanto isso não acontece, todos somos culpados.
Assim, se o Estado não provar às pessoas que residem nos territórios ocupados (vejam bem o drama: O Estado é que é o "ocupante", enquanto o crime é dono) que sua presença representa uma ganho social, de nada adiantará. Alguém dúvida que os poucos líderes presos, se realmente forem lideres de alguma coisa (não vi nenhum colarinho branco preso), estão sendo substituidos nesses mesmos territórios? Alguém acha que os traficantes que fujiram estão, nesse momento, passando por um complexo de culpa e se tornarão bons cidadãos a partir de agora? E o viciado? E o mercado? Existe, então, uma demanda reprimida que será, necessariamente, saciada. Não tenhamos dúvidas disso. É assim no mundo inteiro, a diferença é que em vários países, o tráfico não tem CEP e nem endereço fixo como no caso do Rio de Janeiro.
O tráfico não perdeu. Quem perdeu foram aqueles traficantes presos, e olhe lá. Nem os que fugiram perderam. O Estado não ganhou nada. Apenas tenta retormar a ordem por ele negligenciada por anos de cumplicidade com o crime que hoje se combate. A luta começa agora. Ou o Estado se faz presente, ou então pode preparar a nova ofensiva!
Tratando de Direito
Veja bem, como já explanei, defendo a atuação policial e até acho que houve atraso e benevolência, o que não significa que acho que possa ser possível, em virtude da situação de emergência, a quebra da inviolabilidade de domicílios de centenas de pessoas. A situação não está contemplada no ordem constitucional.
A inviolabilidade de domicílio cede apenas em caso de necessidade de prestar socorro; com mandado judicial, durante o dia; e em flagrante delito. Nenhuma está presente.
Alguns criaram a tese de há flagrante delito que justifique a quebra da inviolabilidade. Precedente perigoso e que deve ser refutado de pronto. O flagrante delito deve ser anterior a quebra da inviolabilidade e não surgir com a quebra.
Se você acha que há flagrante delito e que pode, sim, ser quebrada a inviolabilidade, responda esse exemplo, trazido pra nossa realidade: Amanhã, a polícia alagoana resolve combater o tráfico de drogas no Jacintinho. Traficantes em fuga fogem para a orla da capital, especialmente da Ponta Verde. Nessa situação, poderia a policia invaidir todos os prédios da orla em busca dos fugitivos, mesmo sem mandado judicial. A Ponta Verde estaria em constante estado de flagrante delito e todos os imóveis poderiam ser invadidos? E se seu irmão ou filho estivessem nesse quadro de fugitivo? Sua casa poderia ser invadida sem mandado judicial, em decorrência de uma situação de emergência não contemplada em nosso ordenamento jurídico?. Como diz uma música do Kid Abelha: os outros são os outros, e só.
Como se resolve? A luta é de todos, inclusive do Poder Judiciário e MP. Então que membros destes participem da atuação e estejam presentes sempre que for necessário a expedição de qualquer mandado. Ah! nem me falem em mandado judicial coletivo, por favor.
Com relação a esta matéria, trataterei-a em um post específico.
Por fim, precisamos ter em mente que não há qualquer romantismo nesta história. Não há vencedores e vencidos. Há sim a necessidade de um aprofundamento muito maior da relação do Estado com as pessoas dessas comunidades e a ciência que a luta apenas começou.
Com isto, deixo vocês com Alceu Valença e sua FM Rebeldia. Escutem e reflitam: Precisamos escutar a rebeldia!!!


Um comentário:

Diêgo Fidelis disse...

Vivemos em tempos primitivos, amigo Rogério, nem de Guerra, nem de Paz; - “meio termo”!!! Onde a Política sobrepõe o Direito, sem vice-versa.

E o gargalo emocional, educacional, financeiro e assistencialista deixados pelo Governo, com a ajuda dos usuários de drogas (principais financiadores do tráfico), vem deixando a sobra de bem da coletividade, intensamente desacreditada.

Em outras balizas, é preciso ter muita sensatez, para interpretar a hidráulica dessa colossal invasão policial! E porque não fizeram isso antes? Medo?

Creio que não. Entre aversão e os pactos obscuros, fico eu com a segunda opção!

Além de crer nas sabias palavras de um verdadeiro perito em guerras, onde, nos seguintes termos ele cita em seu tratado histórico; -“A guerra é a continuação da política por outros meios”! (Carl Von Clausewitz).

OBs: Muito bom o texto!