segunda-feira, 27 de junho de 2011

O estado de necessidade e o dever de indenizar

Sabe-se que em sede de direito penal o estado de necessidade retira a ilicitude do ato. Ou seja, o ato praticada, por não passar pelas três fases para a concretização do crime, deixa de ser ilícito. E no direito civil? o estado de necessidade retira também o direito de indenizar? 
A doturina é pacífica ao afirmar que o dano surgido em decorrência de uma fato causado deve ser indenizado, ainda que sob estado de necessidade.Venosa afirma que o estado de necessidade, em sede de  responsabilidade civil está delineado nos arts. 188, II, 929 e 930. O agente, por exemplo, para desviar-se de um precipício, na direção de veículo, lança-se sobre uma pessoa; para desviar-se de uma árvore que tomba a sua frente inopinadamente, invade e danifica a propriedade alheia. Encontra-se justificativa para o mal causado à vítima na remoção de mal iminente. O indivíduo, na iminência de ver atingido direito seu, ofende direito alheio. O ato, em sua essência, seria ilícito, mas a lei reconhece que há uma excludente. No entanto, a escusabilidade do estado de necessidade sofre os temperamentos dos arts. 929 e 930. O primeiro desses dispositivos assegura a indenização ao dono da coisa ofendida, se não for culpado pelo perigo, e o segundo dispositivo expressa que, se o perito ocorrer por culpa de terceiro, contra este deverá ser movida ação regressiva pelo autor do dano, para haver a importância, que tiver ressarcido ao dono da coisa. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano, na hipótese de legítima defesa. Como se conclui, é bastante restrita a possibilidade de o ofensor, em estado de necessidade, eximir-se da indenização".

Neste sentido, o TJMG assim decidiu:

Acórdão: Apelação Cível n. 1.0525.09.174359-7/001, de Pouso Alegre.
Relator: Des. Pereira da Silva.
Data da decisão: 08.06.2011.

Número do processo: 1.0525.09.174359-7/001(1) 
Númeração Única: 1743597-86.2009.8.13.0525 
Processos associados: clique para pesquisar 
Relator: Des.(a) PEREIRA DA SILVA 
Relator do Acórdão: Des.(a) PEREIRA DA SILVA 
Data do Julgamento: 08/06/2011 
Data da Publicação: 17/06/2011 
EMENTA: ACIDENTE DE TRÂNSITO. ABALROAMENTO. DANOS MATERIAIS. VEÍCULO DE TERCEIRO. ILEGITIMIDADE ATIVA DO CONDUTOR. ESTADO DE NECESSIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL. EXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR O PROPRIETÁRIO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 930 DO CC. O condutor de veículo envolvido em acidente de trânsito não tem legitimidade para pleitear indenização pelos prejuízos materiais ocorridos em veículo de propriedade de terceiro. Subsiste a responsabilidade civil do causador direto dos danos a terceiro, mesmo quando age em estado de necessidade, conforme determina o Artigo 930 do Código Civil. 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0525.09.174359-7/001 COMARCA POUSO ALEGRE JOSE RUBENS DE CARVALHO 
APELADO(A)(S) ISABELE MAGLIONI SANTOS 
APELANTE(S) GISELE MAGLIONI SANTOS 
APELANTE(S) LIBERTY SEGUROS S.A. 
APELADO(A)(S) 

ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 10ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em . 

Belo Horizonte, 07 de junho de 2011. 

DES. PAULO ROBERTO PEREIRA DA SILVA, 
RELATOR. 

DES. PAULO ROBERTO PEREIRA DA SILVA (RELATOR) 
VOTO 
Trata-se de Ação Ordinária, proposta por ISABELE MAGLIONI SANTOS e GISELE MAGLIONI SANTOS em face de JOSÉ RUBENS DE CARVALHO e de LIBERTY SEGUROS S.A., objetivando ressarcimento pelos prejuízos materiais causados em seu veículo em acidente de trânsito. 
No mais, adoto o relatório da sentença proferida às fl. 193 / 197, acrescentando que os pedidos foram julgados improcedentes, nos seguintes termos: 
"Desta forma, os atos do primeiro requerido não constituíram atos ilícitos, uma vez que somente realizou manobras bruscas com o fim de desviar seu veículo do automóvel que invadira sua pista, atingindo-lhe e provocando-lhe a perda do controle da direção." 
"(...)" 
"Não havendo como se atribuir a responsabilidade do acidente ao primeiro requerido, resta prejudicado o dever indenizatório quanto ao segundo requerido, que somente responde por atos praticados por aquele, que estejam dentro das condições estabelecidas em sua apólice securitária, o que não é o caso dos autos." 
"Posto isso, diante da absoluta ausência de provas das alegações da inicial, julgo improcedente o pedido inicial, condenando as autoras ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa." 
Inconformada, as Autoras apelaram às fl. 217 / 221, asseverando que dúvida alguma paira nos autos de que os danos no veículo de propriedade da 2ª Apelante foram causados pelo fato de o veículo de propriedade do 1º Apelado tê-lo atingido, defendendo a tese de que, in casu, deve ser aplicada a teoria de responsabilidade civil do causador direto do dano, o qual terá direito de regresso contra o terceiro que causou o acidente. Aduzem que a existência de culpa de terceiro não exime o causador direto do dano em indenizar os prejuízos por ele causados. Pedem, portanto, seja provido seu recurso a fim de se reformar a sentença, julgando-se procedente o pedido inicial. 
Os Réus apresentaram suas contrarrazões às fl. 238 / 251, requerendo o conhecimento, julgamento e provimento do agravo retido aviado às fl. 99. No mérito, pugnam pelo não provimento da apelação. 
Esse, o breve relatório. 
Conheço do recurso porque próprio e tempestivo. 
Estão preenchidos os demais requisitos de admissibilidade recursal. 
Primeiramente, há que se analisar o Agravo Retido aviado pela 2ª Apelada às fl. 99, contra a decisão que indeferiu a preliminar de ilegitimidade passiva. 
AGRAVO RETIDO 
A Seguradora Ré, ora Agravante, entende que a primeira Autora não possui legitimidade para pleitear indenização pelos danos materiais causados em veículo que não é de sua propriedade, não lhe conferindo essa prerrogativa o fato de estar conduzindo o veículo quando da ocorrência do acidente. 
Requer, assim, a extinção do processo, sem resolução do mérito, em relação à primeira Autora, por ilegitimidade ativa. 
Entendo que assiste razão à Agravante e isso porque as Autoras, na petição inicial, nada pleiteiam a título de reparação por danos morais ou indenização por despesas médicas, hospitalares ou remédios para a primeira Autora. 
In casu, o fato de a primeira Autora estar conduzido o veículo no momento do acidente, por si só, não é causa suficiente para lhe dar titularidade a buscar a indenização pelos danos materiais causados ao veículo de propriedade da segunda Autora. 
Assim, como a primeira Autora nada pleiteia para si, na qualidade de vítima do acidente noticiado nos autos, entendo que ela não tem legitimidade ativa para pleitear indenização por danos materiais causados ao veículo de propriedade da segunda Autora, razão pela qual estou, nesta oportunidade, DANDO PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO e extinguindo o processo, sem resolução do mérito, em relação à ISABELE MAGLIONI SANTOS, com fulcro no artigo 267, inciso VI, do CPC. 
Deixo de condená-la ao pagamento dos ônus sucumbenciais tendo em vista o necessário prosseguimento do processo em relação à segunda Autora. 
Passo, agora, à análise das razões da apelação. 
APELAÇÃO 
Noticiam os autos que, no dia 06 de junho de 2009, o veículo de propriedade da Apelante foi atingido pelo veículo de propriedade do primeiro Apelado, o Sr. José Rubens de Carvalho, quando este efetuou manobra brusca a fim de se desviar de veículo de terceiro, que trafegava no mesmo sentido do veículo da Apelante e à sua frente, quando este invadiu sua contramão de direção na tentativa de efetuar manobra de ultrapassagem. 
Através dos fatos narrados pelas partes e pelas provas documentais, não restam dúvidas de que o causador do acidente foi o terceiro, que conduzia o veículo a frente do da Apelante, e que, ao efetuar, de forma irresponsável, manobra de ultrapassagem, invadindo sua contramão direcional, acabou colidindo com o veículo de propriedade do primeiro Apelado o qual, por sua vez, a despeito de tentar efetuar manobra para desviar do veículo conduzido por terceiro, acabou abalroando o veículo da Apelante. 
Desta feita, o caso noticiado nestes autos é um exemplo típico de manutenção da responsabilidade civil do causador direto dos danos, ainda que agindo em estado de necessidade. 
E isso porque o artigo 930 do Código Civil estabelece a responsabilidade civil do autor do dano, mesmo quando o perigo ocorreu por culpa de terceiro: 
"Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado." 
A doutrina é pacífica ao afirmar que, pela sistemática do atual Código Civil Brasileiro, o estado de necessidade não afasta o dever do causador direto do dano em indenizar os prejuízos sofridos. 
Para ilustrar o entendimento doutrinário, trago à colação as considerações feitas por SILVIO DE SALVO VENOSA: 
"O estado de necessidade no campo da responsabilidade civil está delineado nos arts. 188, II, 929 e 930. O agente, por exemplo, para desviar-se de um precipício, na direção de veículo, lança-se sobre uma pessoa; para desviar-se de uma árvore que tomba a sua frente inopinadamente, invade e danifica a propriedade alheia. Encontra-se justificativa para o mal causado à vítima na remoção de mal iminente. O indivíduo, na iminência de ver atingido direito seu, ofende direito alheio. O ato, em sua essência, seria ilícito, mas a lei reconhece que há uma excludente. No entanto, a escusabilidade do estado de necessidade sofre os temperamentos dos arts. 929 e 930. O primeiro desses dispositivos assegura a indenização ao dono da coisa ofendida, se não for culpado pelo perigo, e o segundo dispositivo expressa que, se o perito ocorrer por culpa de terceiro, contra este deverá ser movida ação.

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