sexta-feira, 9 de julho de 2010

Entenda os crimes que estão sendo imputados ao Goleiro Bruno - Parte I

O goleiro Bruno está sendo acusado da prática de vários crimes, especificamente: seqüestro, cárcere privado, agressão, homicídio, ocultação de cadáver.

Começaremos tratando dos crimes de seqüestro e cárcere privado, tipificados no art. 148 do Código Penal:

Seqüestro e cárcere privado

Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado:

Pena - reclusão, de um a três anos.

§ 1º - A pena é de reclusão, de dois a cinco anos:

I – se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 (sessenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

II - se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital;

III - se a privação da liberdade dura mais de quinze dias.

IV – se o crime é praticado contra menor de 18 (dezoito) anos; (Incluído pela Lei 11106, de 2005)

V – se o crime é praticado com fins libidinosos. (Incluído pela Lei 11106, de 2005)

§ 2º - Se resulta à vítima, em razão de maus-tratos ou da natureza da detenção, grave sofrimento físico ou moral:

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

Do tipo penal já podemos identificar logo de inicio a expressão privar alguém de sua liberdade, empregada no sentido de se impedir o direito de ir e vir, ou seja, a liberdade física da vítima.

Deve-se ressaltar que a lei penal usa os termos seqüestro e cárcere privado dando a impressão que se trata de condutas distintas. No entanto, entende-se que seqüestro e cárcere privado significam a mesma coisa. Rogério Greco afirma que “a única diferença que se pode apontar entre eles, para que se possa aproveitar todas as letras da lei, é no sentido de que quando se cuida de seqüestro existe maior liberdade ambulatorial; ao contrário, quando a liberdade ambulatorial é menor, ou seja, o espaço para que a vítima possa se locomover é pequeno, reduzido, trata-se de cárcere privado”.

Daí, o CP prevê duas modalidades qualificadas de seqüestro ou cárcere privado, descritas no art.148, §1º e §2º, respectivamente.

Entende-se que o bem juridicamente protegido pela norma penal é a liberdade pessoal, entendida enquanto liberdade física, ou seja, o direito de ir e vir ou permanecer, nas formas do art.5º, XV da Constituição Federal.

XV – é livre a locomoção no território nacional em tempos de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer, ou dele sair com seus bens;

Já o objeto material é a pessoa privada da liberdade, contra a qual recai a conduta do agente.

Pode-se também definir que qualquer pessoa pode ser tanto o sujeito ativo quanto o sujeito passivo do crime em análise, não sendo necessário qualquer qualidade ou condição pessoal. Apenas ressalte-se que se o crime é praticado por funcionário público no exercício de suas funções, por força do princípio da especialidade, aplica-se a Lei 4.898/65 (Abuso de Autoridade), em seu art. 3º, alínea “a”.

O crime de seqüestro ou cárcere privado consuma-se com a efetiva impossibilidade de locomoção da vítima. Aníbal Bruno afirma que “consuma-se quando o coagido é privado de sua liberdade. Mas é um caso típico de crime permanente. Não se esgota num acontecer instantâneo, como no homicídio; o seu momento consumativo prolonga-se por tempo mais ou menos dilatado e dura até que o próprio agente, ou qualquer circunstância lhe ponha fim, recuperando a vítima a sua inteira liberdade”. Deve ter em mente que a caracterização do crime não requer a remoção da vítima, podendo se consumar a infração penal desde que esta se veja impedida de sair do local em que se encontra.

Trata-se de crime em que se admite a tentativa, pelo fato de se poder fracionar o inter criminis.

O dolo, direto ou eventual, é o elemento subjetivo do crime de seqüestro ou cárcere privado. No entanto, o dolo relativo ao delito de seqüestro ou cárcere privado diz respeito tão somente a privar alguém de sua liberdade. Se houver um dado que especialize a privação de liberdade, estaremos diante de outra conduta típica. Exemplo esclarecedor vem daquele em que alguém seqüestra outra pessoa com o fim de obter para si ou para outrem qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate. Neste caso temos o crime de extorsão mediante seqüestro.

Quanto às modalidades qualificadas, elas estão previstas nos §§ 1º e 2º do art. 148, sendo que a ultima pune mais severamente o acusado. Merece destaque o fato de que caso o agente pratique conduta que se amolde em ambos os parágrafos, deverá ter aplicação tão-somente um deles, ou seja, o que tive maior pena cominada.

Analisaremos cada uma das qualificadoras:

I - Vítima ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 anos.

Importante frisar que para efeito de reconhecimento da qualificadora, o agente deve saber que pratica crime contra ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 anos, pois, caso contrário, poderá incorrer no chamado erro de tipo, afastando a qualificadora. Por força do art. 227, §6º da Constituição Federal, o filho adotivo goza de status de descendente e o crime contra ele praticado faz incidir a qualificadora em análise.

II – Se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital.

Aqui a lei especifica que os locais para tratamento de saúde física ou mental das pessoas pode ser utilizado para a retirada de pessoas do convívio social, sendo a internação uma fraude praticada pelo agente, no sentido de encobrir sua verdadeira finalidade. Nestes casos, a pessoa responsável pela internação, quer seja médico ou diretor do hospital, poderá ser considerado co-autor do crime

III – Se a privação da liberdade dura mais de quinze dias.

Neste caso, conta-se o primeiro dia de privação da liberdade da vítima, independentemente da hora em que ocorreu. Observe para o fato de que a lei diz mais de quinze dias, ou seja, no mínimo dezesseis dias.

IV – Se o crime é praticado contra menor de 18 anos.

Tal como ocorre com o inciso I, para a aplicação da qualificadora é necessário a comprovação nos autos da idade da vítima, assim como o fato de o agente ter conhecimento da condição de menor da vítima.

V – Se o crime é praticado com fins libidinosos.

Aqui qualquer agente poderá ser sujeito passivo, bastando que o agente (homem ou mulher) dirija seu comportamento com o fim de praticar atos libidinosos com a vítima. O que importa é a finalidade especial com que atua o agente. A qualificadora, neste caso, incidirá mesmo que o agente não pratique qualquer ato de natureza libidinosa com a vítima.

VI – Se resulta à vitima, em razão dos maus tratos ou da natureza da detenção, grave sofrimento físico ou moral. (Art 148, §2º).

Esta qualificadora é composta por vários elementos que exigem valoração. Nelson Hungria analisando-as afirma que “por maus tratos se deve entender qualquer ação ou omissão que cause ou possa causar dano ao corpo ou saúde da vítima ou vexá-la moralmente. Se dos maus tratos resultar lesão corporal ou morte, haverá concurso material de crimes. A expressão detenção refere-se ao modo e condições objetivas da detenção em si mesma (meter a vítima a ferros ou no tronco, insalubridade do local, forçada promiscuidade da vítima com gente de classe muito inferior à sua, exposição da vítima a males ou perigos que excedem aos da forma simples do crime).

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