"É VÁLIDA a lei que reserva ao Executivo o poder privativo de conceder asilo ou refúgio", assinalou o Supremo Tribunal Federal quando arquivou, sem julgar o mérito, a ação para extraditar o colombiano Francisco Cadena, em 2007.
Acusado por terrorismo e homicídio, o integrante da narcoguerrilha marxista Farc havia obtido status de refugiado político do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), ligado ao Ministério da Justiça. Diante do benefício, o STF recusou-se a analisar a extradição.
O precedente terá de ser enfrentado na ação movida pela Itália para extraditar Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua por quatro homicídios. O Supremo volta à rotina hoje e pode discutir o assunto tão logo se manifeste o governo da Itália, que tem até quarta para fazê-lo.
No Brasil, é do STF a competência para julgar pedidos de extradição de estrangeiros. Já o governo federal detém a atribuição de declarar o refúgio político e de conceder asilo territorial -asilo e refúgio têm efeitos práticos semelhantes. A concessão do refúgio ou do asilo pelo Executivo, no entanto, faz cessarem, de acordo com a lei, os procedimentos de extradição no Judiciário.
Não é por mero formalismo que o sistema funciona assim. O próprio Supremo forneceu uma razão forte ao declarar, no citado juízo de 2007, que é do Executivo "a competência para tomar decisões [como dar refúgio] que tenham reflexo no plano das relações internacionais do Estado". Além disso, esse é o tipo de decisão que sempre comporta alguma margem de arbítrio político.
Mesmo assim, é inegável o caráter anômalo, às raias do estapafúrdio, da concessão do refúgio a Battisti. O ministro Tarso Genro, embora valendo-se de uma prerrogativa legal, atropelou os argumentos técnicos do Conare e produziu um libelo de frouxo embasamento jurídico, além de ofensivo às instituições italianas, francesas e europeias.
A margem de arbítrio do ministro da Justiça em questões de asilo e refúgio existe, mas está limitada pela lei do refúgio político, de 1997. O benefício a Battisti, por exemplo, foi concedido com base em temor de perseguição por motivos de "opinião política", o que é impossível de justificar com base nos autos.
Não será surpresa, portanto, se o Supremo desqualificar os frágeis argumentos de Genro e julgar a extradição mesmo assim.
Editorial da Folha de São Paulo de 02/fev/2009
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